Espírito: MEIMEI.
Passaste por mim com simpatia, mas quando me viste os
olhos parados, indagaste em silêncio porque vagueio na rua.
Talvez por isso estugaste o passo e, embora te quisesse
chamar, a palavra esmoreceu me na boca.
É possível tenhamos suposto que desisti do trabalho, no
entanto, ainda hoje, bati, em vão, de oficina a oficina... Muitos disseram que
ultrapassei a idade para ganhar dignamente o meu pão, como se a madureza do
corpo fosse condenação à inutilidade, e outros, desconhecendo que vendi minha
roupa melhor para aliviar a esposa doente, despediram-me apressados,
acreditando-me vagabundo sem profissão.
Não sei se notaste quando o guarda me arrancou à
contemplação da vitrina, a gritar me palavras duras, qual se eu fosse vulgar
malfeitor. Crê, porém, que nem de leve me passou pela mente a idéia de furto;
apenas admirava os bolos expostos, recordando os filhinhos a me abraçarem com a
fome, quando retorno à casa.
Ignoro se observaste as pessoas que me endereçavam
gracejos, imaginando-me embriagado, porque eu tremesse, encostado ao poste;
afastaram-se todas, com manifesto desprezo, contudo não tive coragem de
explicar-lhe que não tomo qualquer alimento, há três dias...
A ti, porém, me fitaste sem medo, ouso rogar apoio e
cooperação. Agradeço a dádiva que me estendas, no entanto, acima de tudo, em
nome do Cristo que dizemos amar, peço me restituas a esperança, a fim de que eu
possa honrar, com alegria, o dom de viver. Para isso, basta que te aproximes de
mim, sem asco, para que eu saiba, apesar de todo o meu infortúnio, que ainda
sou teu irmão.
imagem: google
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