Libertação pela Morte
O corpo é abençoado presídio celular temporário que retém o espírito, impedindo-lhe a lucidez plena da realidade, facultando-lhe o germinar das divinas potências que lhe jazem adormecidas no imo e que procedem de Deus.
A morte deve ser cuidadosamente estudada e comentada em todas as oportunidades existenciais, a fim de que seja liberada dos artifícios que lhe foram colocados pela ignorância e pelas religiões do passado.
Educando-se o cidadão com vistas ao seu triunfo social e econômico, moral e cultural, é necessário conscientiza-lo em torno da morte, tendo em vista ser uma fatalidade da qual ninguém se livra.
Preparando-se para morrer de maneira digna e natural, o ser humano altera completamente a paisagem social em que se encontra, por estabelecer condições para que o fenômeno transcorra sem choque nem traumatismo, ante a certeza do reencontro que facultará o prosseguimento das afeições, a liberação das mágoas, a ampliação da capacidade de compreender e de desenvolver os valores espirituais que exornam a todos.
Esse engodo em torno da perenidade do corpo, tem sido responsável pela amargura em que muitos se afundam quando convidados a reflexionar em torno da morte de outrem que lhe é querido, ou tem-se tornado responsável pelo desequilíbrio de diversos, não raro arrebatando outras existências também que não se conformaram com a ocorrência previsível...
Surgem os compromissos com os atos saudáveis, os pensamentos corretos e as confabulações edificantes, propiciando valores emocionais que libertam das injunções fisiológicas após a ocorrência libertadora.
Quando isso não se dá, as fixações doentias, os hábitos insanos, as condutas perturbadoras atam o espírito a essas e outras paixões, proporcionando-lhe sofrimentos inimagináveis, até que se diluam os vestígios materiais pela decomposição cadavérica.
Mesmo quando isso ocorre, as impressões permanecem dando a ilusão de que não houve a interrupção da organização material e o espírito, alucinando-se, nega-se a compreender o estado em que se encontra, tombando em distúrbios complexos e aflitivos.
O amadurecimento psicológico do indivíduo trabalha-o para considerar que, por mais longa se lhe apresente a existência, chegará sempre o momento em que será interrompida, e, dessa forma, equipa-se de sentimentos de renúncia e de abnegação, tornando-se grato pelas experiências adquiridas, assim como anelando pela conquista de outras realizações enobrecedoras.
A conscientização em torno da efemeridade da vilegiatura carnal, amadurece os sentimentos que se desapegam da posse, que superam os caprichos do ego, dando maior valor às realizações do self que passa a merecer melhor contribuição de esforços e de atividades iluminativas.
A psicoterapia preventiva trabalha em favor da autoconsciência em torno da vida e da morte, constituindo a realidade única a imortalidade do espírito.
A psicoterapia curadora, quando a morte ameaça ou arrebatou alguém muito caro, propõe o despertar da razão, sem pieguismo nem rebeliões, objetivando a análise direta e sem disfarce das vantagens de que se reveste a diluição do corpo, candidato ao envelhecimento, às desorganizações, à perda da estrutura com que se apresenta.
Do livro: CONFLITOS EXISTENCIAIS
Divaldo Pereira Franco/Joanna de Angelis
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