“Meu Pai trabalha até agora, eu também trabalho” – Jesus (Jo 6:17)
A Doutrina Espírita, como em qualquer outro campo, tem muito para
nos esclarecer com relação ao trabalho.
Allan Kardec destinou o terceiro capítulo da terceira parte d’O
Livro dos Espíritos ao assunto, propondo logo na abertura do capítulo:
A necessidade do trabalho é uma lei da natureza?
– O trabalho é uma lei natural, por isso mesmo é uma necessidade,
e a civilização obriga o homem a trabalhar mais, porque aumenta suas
necessidades e prazeres. (Questão 674)
Note-se que os Espíritos Superiores se referem a satisfação das
necessidades e prazeres humanos, ficando claro que a satisfação de ambos é
responsabilidade pessoal, mas como também temos necessidades e obrigações
subjetivas somos direcionados a outro questionamento:
Devem-se entender por trabalho somente as ocupações materiais?
– Não; o Espírito também trabalha, assim como o corpo. Toda
ocupação útil é trabalho. (Questão 675)
E o trabalho, continuam os Benfeitores, é:
“Um meio de aperfeiçoar sua inteligência. Sem o trabalho, o homem
permaneceria na infância da inteligência; por isso deve seu sustento, segurança
e bem-estar apenas ao seu trabalho e à sua atividade. Àquele que tem o corpo
muito fraco, Deus deu a inteligência como compensação; mas é sempre um
trabalho”. (Questão 676)
E que por isso mesmo o objetivo é duplo:
“A conservação do corpo e o desenvolvimento do pensamento, que é
também uma necessidade que o eleva acima de si mesmo”. (Questão 677)
A finalidade da encarnação, como sabemos, é a de dar condições ao
Espírito de atingir a sua perfeição, e por isso há a necessidade do trabalho de
crescimento íntimo, não importando a condição material em que se estagia,
inclusive na abastança, como se verifica no questionamento feito por Kardec:
O homem que possui bens suficientes para assegurar sua existência
está livre da lei do trabalho?
– Do trabalho material, pode ser, mas não da obrigação de se
tornar útil conforme seus meios, de aperfeiçoar sua inteligência ou a dos
outros, o que é também um trabalho. Se o homem a quem Deus distribuiu bens
suficientes não está obrigado a se sustentar com o suor de seu rosto, a
obrigação de ser útil a seus semelhantes é tanto maior quanto as oportunidades
que surjam para fazer o bem, com o adiantamento que Deus lhe fez em bens
materiais. (Questão 679)
Porém, como na sociedade humana há os que não possuem condições de
conseguir seu sustento, Allan Kardec pergunta:
Não há homens impossibilitados para trabalhar no que quer que seja
e cuja existência é inútil?
– Deus é justo. Apenas desaprova aquele que voluntariamente tornou
inútil sua existência, porque esse vive à custa do trabalho dos outros. Ele
quer que cada um se torne útil conforme suas aptidões. (Questão 680)
Observando o ciclo natural de nossas vidas, facilmente, observamos
que a força física necessária ao trabalho se alterna, e por isso vale o
questionamento:
A lei natural impõe aos filhos a obrigação de trabalhar por seus
pais?
– Certamente, do mesmo modo que os pais devem trabalhar por seus
filhos; é por isso que Deus fez do amor filial e do amor paternal um sentimento
natural para que, por essa afeição recíproca, os membros de uma mesma
família fossem levados a se ajudarem mutuamente, o que é frequentemente
esquecido em vossa sociedade atual. (Questão 681)
Quanto ao repouso, que também é uma necessidade, os Benfeitores
Espirituais esclarecem-nos que se trata de Lei Natural, porque:
O repouso repara as forças do corpo e é também necessário para dar
um pouco mais de liberdade à inteligência, para que se eleve acima da matéria.
(Questão 682)
Mas, se o trabalho e o repouso são necessidades humanas, o limite
do primeiro e o tamanho do segundo estão sujeitos às forças e consciência de
cada um, e sempre sujeitos às Leis Divinas, que corrige, naturalmente, os
abusos cometidos.
A respeito do assunto e aproveitando o momento em que a sociedade
brasileira discute a reforma do Sistema Previdenciário oficial, convém
meditarmos nos seguintes questionamentos e respostas constantes do capítulo em
tela:
O homem tem direito ao repouso na velhice?
– Sim. Ao trabalho está obrigado apenas conforme suas
forças. (Questão 685)
Mas que recurso tem o idoso necessitado de trabalhar para viver,
se já não pode?
– O forte deve trabalhar pelo fraco e, na falta da
família, a sociedade deve tomar o seu lugar: é a lei da caridade. (Questão
685 a)
Do exposto acima, parece-nos que está implícito nas respostas dos
Espíritos Superiores que, aposentar-se não exime ninguém do trabalho, enquanto
ainda houver forças para tal e respeitando-se, evidentemente, a condição física
em relação a função. Assim como também está implícito que essa mesma sociedade,
leia-se o Governo que a representa, tem a obrigação de amparar os que,
comprovadamente, não possuem condições de se sustentarem e de viverem com um
mínimo de dignidade, não sendo, portanto, tão somente uma questão de déficit
auferido pela matemática fria e desumana das teorias econômicas.
Pensemos nisso.
Antônio Carlos Navarro
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