A psicologia sociológica do passado recomendava a posse
como forma de segurança. A felicidade era medida em razão dos haveres
acumulados, e a tranqüilidade se apresentava como sendo a falta de preocupação
em relação ao presente como ao futuro.
Aguardar uma velhice descansada, sem problemas financeiros,
impunha-se como a grande meta a conquistar.
A escala de valores mantinha como patamar mais elevado a
fortuna endinheirada, como se a vida se restringisse a negócios, à compra e
venda de coisas, de favores, de posições.
Mesmo as religiões, preconizando a renúncia ao mundo e
aos bens terrenos, reverenciavam os poderosos, os ricos, enquanto se adornavam
de requintes, e seus templos se transformavam em verdadeiros bazares, palácios
e museus frios, nos quais a solidariedade e o amor passavam desconhecidos.
A felicidade se apresentava possível, desde que se pudesse
comprá-la. Todos os programas traziam como impositivo prioritário o prestígio
social decorrente da posse financeira ou do poder político.
Cunhou-se o conceito irônico de que o dinheiro não dá felicidade, porém ajuda a
consegui-la. Ninguém o contesta; no entanto, ele não é tudo.
O imediatismo substituiu os valores legítimos da vida, e
houve uma natural subestima pelos códigos éticos e morais, as conquistas
intelectuais, as virtudes, por parecerem de somenos importância.
Não se excogitava, então, averiguar se as pessoas poderosas
e possuidoras de coisas eram realmente felizes, ou se apenas fingiam sê-lo.
na atualidade, ainda permanecem alguns bolsões de
imposição para que o homem tenha, sem a preocupação com o que ele seja.
O prolongamento da idade infantil, em mecanismos escapistas
da personalidade, faz que a existência permaneça como um jogo, e os bens, como
as pessoas, tornem-se brinquedos nas mãos dos seus possuidores.
Os homens, entretanto, não são marionetes de fácil manipulação.
Cada indivíduo tem as suas próprias aspirações e metas, não podendo ser movido,
pelo prazer insano ou com bons propósitos que sejam, por outras pessoas.
Esses atavismos infantis não absorvidos pela idade adulta,
impedindo o amadurecimento psicológico encarregado do discernimento, são
igualmente responsáveis pela insegurança que leva o indivíduo a amontoar
coisas e a cuidar do ego, em detrimento da sua identidade integral. Sem que se
dê conta, desumaniza-se e passa à categoria de semideus, desvelando os
caprichos infantis, irresponsáveis, que se impõem, satisfazendo as
frustrações.
O amadurecimento psicológico equipa o homem de resistências
contra os fatores negativos da existência, as ciladas do relacionamento social, as dificuldades do cotidiano.
Importante, desse modo, é manter-se o equilíbrio entre
ser e exteriorizar o que se é, sem conflito comportamental, eliminando os
estados de tensão resultantes da insatisfação ou do comodismo, assim, realizando-se,
interior e exteriormente.
Nesta luta entre o ego artificial, arquetípico, e o eu
real, eterno e evolutivo, os conteúdos ético-morais da vida têm prevalência,
devendo ser incorporados à conduta que os automatiza, não mais gerando áreas
psicológicas resistentes à auto-realização, e liberando-as para um estado de
plenitude relativa, naturalmente, em razão da transitoriedade da existência
física.
É óbvio que não fazemos a apologia da escassez ou da
miséria, na busca da realização pessoal. Tampouco, propomos o desdém à posse,
levando a mente a ilhas onde se homiziam o despeito e a falsa auto-suficiência.
A posse é uma necessidade para atender objetivos próprios,
que não são únicos nem exclusivos. Os recursos amoedados, o poder político ou
social são mecanismos de progresso, de satisfação, enquanto conduzidos pelo
homem. Quando se inverte a situação, o iminente desastre está à vista.
Os recursos são para o
homem utilizá-los, ao invés deste se lhes tornar servil, arrastado pelos
famanazes dos interesses subalternos que, de auxiliares da pessoa de destaque,
passam à condição de controladores das circunstâncias, aprisionando nas suas
hábeis manobras aquele que parece conduzi-las...
Não é a posse que o
envilece. Ela faculta-lhe o desabrochar dos valores inatos à personalidade, e
os recalques, os conflitos em predominância assomam, prevalecendo-lhe no
comportamento.
Eis aí a importância do
amadurecimento psicológico do indivíduo, que lhe proporciona os meios de gerir
os recursos, sem se lhes submeter aos impositivos. Quando se tem a sabedoria
de administrar os valores de qualquer natureza, a benefício da vida e da
coletividade, não apenas se possui, sobretudo se é livre, nunca possuído pelas
enganosas engrenagens dos metais preciosos, dos títulos de negociação, dos documentos
de consagração e propriedade, todos, afinal, perecíveis, que mudam de mão, que
são fáceis de perder-se, destruir-se, queimar-se...
A integridade e a
segurança defluem do que se é, jamais do que se tem.
Do livro: O Homem Integral – Divaldo Pereira Franco/Joanna Di Ângelis
imagem: www.wandilsonramalho.com.br
Um comentário:
Houve um tempo em que as pessoas trabalharam para ter muito dinheiro e uma velhice sossegada - feliz.
A fellcidade não está no ter mas sim no ser o que em linguagem corrente quer dizer que a felicidade mora dentro da pessoa e não no seu mealheiro
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