Passaste por mim com simpatia, mas quando me viste os
olhos parados, indagaste em silencio porque vagueio na rua.
Talvez
por isso estugaste o passo e, embora te quisesse chamar, a palavra esmoreceu-me
na boca. É possível tenhas suposto que desisti do trabalho, no entanto, ainda
hoje, bati, em vão, de oficina a oficina. Muitos disseram que ultrapassei a
idade para ganhar dignamente o meu pão, como se a madureza do corpo fosse
condenação à inutilidade, e outros, desconhecendo que vendi minha roupa melhor
para aliviar a esposa doente, despediram-me apressados, acreditando-me
vagabundo sem profissão.
Não
sei se notaste quando o guarda me arrancou à contemplação da vitrina, a
gritar-me palavras duras, qual se eu fosse vulgar malfeitor. Crê, porém, eu nem
de leve me passou pela mente a idéia de furto: apenas admirava os bolos
expostos, recordando os filhinhos a me abraçarem com fome, quando retorno à
casa.
Ignoro
se observaste as pessoas que me endereçavam gracejos, imaginando-me embriagado,
porque eu tremesse, encostado ao poste: afastaram-se todas, com manifesto
desprezo, contudo não tive coragem de explicar-lhes que não tomo qualquer
alimento, há três dias.
A
ti, porém, que me fitaste sem medo, ouso rogar apoio e cooperação. Agradeço a
dádiva que me estendas, no entanto, acima de tudo, em nome do Cristo que
dizemos amar, peço me restituas a esperança, a fim de que eu possa honrar, com
alegria, o dom de viver. Para isso, basta que te aproximes de mim, sem asco,
para que eu saiba, apesar de todo o meu infortúnio, que ainda sou teu irmão.
Fonte: Ideal Espírita –
Chico Xavier/Meimei
imagem: google
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